“Conhecer Carlos Scliar é conhecer um período importante para a compreensão do fenômeno artístico no Brasil, porque significa conhecer uma pessoa da mais aguda consciência profissional, um artista de decisiva importância numa luta que, concordemos ou não, é básica.
A luta de Scliar, em sua atuação como pintor foi, sobretudo, do ponto de vista da análise não-estética, a luta em um plano que hoje se constitui como núcleo fundamental de discussão. Tratava-se, entre outras coisas, de tornar digno o ato de pintar, ou seja, criar condições para que os artistas pudessem viver de seu trabalho.
Essa luta deu frutos e é agora, portanto, nossa herança.
Mas de que maneira devemos reagir diante dessa herança? Ou a usufruímos e depois de um certo tempo descobrimos que só usufruiremos se nos contentarmos com um estilo (e o estilo é um compromisso que assumimos para sermos entendidos, ouvidos, em suma, respeitados – jamais permitindo que alguém prossiga descobrindo coisas, porque nos obriga a produzir coisas e descobertas já feitas por nós mesmos), ou lutamos contra ela, já que não podemos ignorá-la com os meios e os critérios que temos em mãos. Essas duas soluções não excluem outras.
Penso também que em qualquer começo de caminhada – e acho que estamos nele – todos temos a responsabilidade maior de, ao lado de buscar alianças e afinidades, situar as divergências existentes.
O diálogo com Scliar permite isto.”
(Cildo Meireles, agosto/2001)